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sexta-feira, 23 de maio de 2014

Vende-se o transporte de Maceió: apenas R$ 16,12 por dia/ônibus

 
Tomamos a liberdade de copiar o título da publicação do Portal Mobilize por tratar-se de situação semelhante à que ocorre em Maceió. O serviço de transporte por ônibus de Salvador está em processo de licitação e, assim como em Maceió, pretende-se licitá-lo por 25 anos, tendo como critério de escolha das empresas o “maior valor de outorga”.

Na Audiência Pública realizada em 30/01/2014, para discutir a licitação do transporte coletivo de Maceió, questionamos o critério que se pretende adotar por considerarmos inadequado para escolha das empresas. Além do período de 25 anos ser extenso demais (em razão das modificações que a cidade sofre e do seu Plano Diretor ser revisado a cada 10 anos), o valor de outorga estipulado pela Prefeitura de Maceió (R$ 87 milhões) é insignificante para os cofres públicos. Para se ter uma ideia da dimensão desse valor, apenas em 2013, as empresas que operam o transporte coletivo em Maceió arrecadaram R$ 185 milhões.


O Portal Mobilize publicou um cálculo interessante que foi feito pelo professor e técnico da Prefeitura de Salvador, Francisco Ulisses, onde ele divide o valor de outorga que se pretende arrecadar das empresas concorrentes pelo período da licitação e pela quantidade de ônibus que circulam atualmente. Ele encontrou o valor de R$ 7,36 ao dia/ônibus. Ou seja, de todo o valor que for arrecadado durante um dia por um ônibus em Salvador, R$ 7,36 serão pagos à Prefeitura, o que equivale a menos de três tarifas, que lá custa R$ 2,80.

O estudante de Arquitetura e Urbanismo, Luiz Gustavo, publicou, no grupo do Facebook da Bicicletada de Maceió, os cálculos referentes a Maceió. Acompanhe:

Valor mínimo de outorga = R$ 87.000.000,00
Vigência do contrato = 25 anos
 
R$ 87.000.000 / 25 anos = R$ 3.480.000/ano
R$ 3.480.000 / 12 meses = R$ 290.000/mês
R$ 290.000 / 30 dias = R$ 9.666,67/dia
R$ 9.666,67 / 600 ônibus* = R$ 16,12 por dia/ônibus
*Aproximadamente a atual frota de Maceió.

Portanto, vende-se o transporte de Maceió por apenas R$ 16,12 por dia/ônibus.


Agora, para se ter uma ideia do que representa esse valor, vejamos quanto cada ônibus arrecada por dia. Segundo a SMTT, em 2013, foram transportados, em média, 6,7 milhões de passageiros equivalentes (subtraindo os estudantes e as gratuidades do total transportado). Então, temos:

6,7 milhões pass/mês X R$ 2,30* = R$ 15,4 milhões / mês
R$ 15,4 milhões / 30 dias = R$ 513 mil / dia
R$ 513 mil / 600 ônibus = R$ 855,00 por dia / ônibus
* O valor de R$ 2,50 passou a vigorar a partir de 2014


Portanto, em 2013, cada ônibus que circulou em Maceió arrecadou, em média, R$ 855,00 por dia. Atualizando para o valor da tarifa vigente atualmente (R$ 2,50), encontramos o valor de R$ 930,55. Então, se o transporte coletivo de Maceió for licitado com a tarifa de R$ 2,50, o valor de outorga que as empresas terão de pagar à Prefeitura a cada dia, por cada ônibus, corresponderá a 1,73% de tudo aquilo que o ônibus arrecada. Além do mais, conforme foi dito na audiência, esse valor será pago em quatro anos. Como estamos em meados de 2014, caso a licitação saia daqui para o final do ano, as empresas pagariam esse valor de outorga em 2015, 2016, 2017 e 2018. Depois, até 2039, as cinco gestões que sucederem a atual e a próxima não verão um centavo desse dinheiro, que ficará praticamente todo à disposição da atual gestão (2013/2016) e da seguinte (2017/2020).

É lógico que os 98,27 % restantes não correspondem à lucratividade da empresa. Ela tem que pagar o investimento feito na compra dos ônibus, seus funcionários, combustível dos ônibus, peças, pneus, impostos, etc. Mas mesmo que o valor de outorga seja maior, o fim a que serve a licitação é para encher os cofres da Prefeitura ou para prestar um serviço de qualidade aos usuários?

Sabemos que atualmente o valor da tarifa é inversamente proporcional à qualidade do serviço. Em 17/02/2014, fomos convidados a participar de reunião no Ministério Público de Contas, para que pudéssemos detalhar melhor as propostas que apresentamos no documento que protocolamos, em junho de 2013, no Ministério Público Estadual, e na Audiência Pública realizada em 30/01/2014. Naquela ocasião, falamos das reuniões que temos tido com a Prefeitura de Maceió a fim de discutir sobre a Tarifa Zero.

Mais importante do que definir o valor da tarifa para a licitação é decidir quem vai pagar essa tarifa. Enquanto o serviço de transporte coletivo continuar sendo tratado como uma mercadoria, onde só pagam aqueles que o utilizam, não há como esperar alguma melhoria. Não há como esperar que a classe média e os ricos (que entopem a cidade de carros) passem a utilizar o transporte coletivo enquanto este for sustentado pelos mais pobres. E não há como esperar alguma melhoria do transporte coletivo sustentada em míseros R$ 87 milhões divididos em 25 anos.

Enquanto o edital de licitação é discutido entre a Prefeitura de Maceió, Ministério Público Estadual e Ministério Público de Contas, esperamos que as reuniões que vínhamos tendo com a Prefeitura para tratar da Tarifa Zero possam avançar e que esta nova forma de custear o serviço de transporte coletivo possa compor o edital de licitação. Mas, para isso, precisamos de agilidade. A 5ª reunião que teríamos, que estava marcada para 06/05/2014, não aconteceu e ainda não tem data marcada para acontecer.

Se a Tarifa Zero não for incluída nesse edital que se pretende para os próximos 25 anos, teremos grande dificuldade de incluir após a realização da licitação.

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