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segunda-feira, 7 de abril de 2014

As bicicletas e a faixa azul



Desde novembro de 2013, a Prefeitura de Maceió tem pintado uma faixa azul contínua nas avenidas Tomás Espíndola, Fernandes Lima e Durval de Góes Monteiro, destinada à circulação dos ônibus, com o objetivo de reduzir o tempo gasto pelos usuários de transporte coletivo. A medida começou a valer, de maneira experimental, a partir de 17/02/2014 e, de maneira definitiva, a partir de 10/03/2014.

Além dos ônibus, têm permissão para utilizar a faixa: os táxis, as bicicletas, veículos de emergência e todos automóveis que pretendam acessar os lotes lindeiros e as ruas transversais à avenida. Para garantir o respeito aos ciclistas, por parte dos motoristas de ônibus, a SMTT realizou treinamento para alertar aos motoristas sobre a necessidade de proteger os usuários de bicicleta, parte mais frágil do trânsito, sob o risco de provocar seu óbito no caso de uma colisão entre ônibus e bicicleta.


Foi informado aos motoristas de ônibus que as ultrapassagens deverão ser feitas apenas nos locais onde a faixa azul se torna dupla e permite a ultrapassagem da bicicleta sem descumprir o Art. 201 do Código de Trânsito Brasileiro. Por coincidência, nesses locais onde a faixa azul é duplicada, estão localizados os pontos de ônibus. Portanto, os ônibus pararão e os ciclistas seguirão, não tornando possível a ultrapassagem. Quando a faixa é única, os motoristas foram orientados a aguardar atrás da bicicleta, de modo a ter tempo suficiente para frear o ônibus e evitar passar por cima do ciclista, no caso de um tombo.

Exemplo de local onde a faixa azul é dupla.

Porém, o treinamento não foi realizado com todos os motoristas de ônibus que circulam pela avenida. Aqueles que não assimilaram o que foi passado no treinamento e, principalmente, aqueles que não passaram pelo treinamento não entenderam que devem aguardar atrás da bicicleta, numa distância segura, até que a faixa se torne dupla, para que possa realizar a ultrapassagem. Alguns motoristas de ônibus continuam acreditando que a bicicleta deve andar junto à sarjeta e que o ônibus deve ultrapassá-la a um palmo do guidão da bicicleta, descumprindo o art. 201 do Código de Trânsito Brasileiro.

A maioria dos ciclistas adota uma posição submissa no trânsito, não tem noção que a bicicleta tem prioridade sobre os demais veículos e se espreme junto à sarjeta, colocando sua vida em risco. Alguns ciclistas perceberam que não são gatos e, portanto, não têm sete vidas, para ficar observando os veículos passando a um palmo do guidão da bicicleta a todo instante, colocando sua vida em risco. Com isso, optam por ocupar o meio da faixa, o que força os veículos motorizados a mudarem de faixa para realizar a ultrapassagem.
 
Porém, alguns motoristas de ônibus e de táxi, que não entenderam que a faixa azul é compartilhada com bicicletas, decidem importunar os ciclistas buzinando freneticamente na traseira da bicicleta e/ou colar o veículo na traseira da bicicleta e ficar acelerando ferozmente, como forma de intimidar o ciclista a “sair da frente” (expressão usada pelos motoristas).

Na manhã de hoje, Daniel Moura, participante da Bicicletada de Maceió, foi ameaçado por uma motorista de ônibus e agredido por um passageiro do ônibus, depois que a motorista, de ma fé, abriu a porta para que o passageiro descesse e fizesse aquilo que ela gostaria, mas não podia fazer. Daniel nos enviou um relato do ocorrido que segue abaixo:


“Por volta das 10 h do dia 07/04/2014, em frente ao Shopping Cidade, na Av. Fernandes Lima, a motorista do carro nº 5093, da empresa Cidade de Maceió, ficou colando na traseira de minha bicicleta, enquanto eu circulava pela faixa azul (ocupando o meio da faixa). Virei o corpo para trás e sinalizei com o braço pedindo que a motorista mantivesse uma distância segura (Art. 29, II, da lei 9.503/97, do Código de Trânsito Brasileiro - CTB). A motorista ignorou e colou ainda mais o ônibus. Parei a bicicleta com cuidado, desmontei e fui até a janela do ônibus:

— Se eu levar um tombo da bicicleta e a senhora estiver assim tão próximo de mim, não vai dar tempo de frear e vai passar com o ônibus por cima de mim.
— É o que eu vou terminar fazendo mesmo se você não sair da minha frente.

Ela estava bastante nervosa e pedi que ela se acalmasse, pois, se saíssemos dali daquele jeito, ela provavelmente descontaria sua raiva jogando o ônibus em cima de mim na continuação do percurso. Ela fechou a janela do ônibus com toda força. Fui para frente do ônibus e, enquanto fotografava a situação, sugeri que ela ultrapassasse pela faixa do meio.

Em situações semelhantes, os motoristas de ônibus argumentam que não vão para a faixa do meio para não serem multados. Segundo os motoristas, o ciclista deve trafegar pelo bordo da via (Art. 58 do CTB) e o ônibus deve ultrapassá-lo sem sair da faixa azul, cometendo outra infração, já que a faixa tem 3,00 m de largura, o ônibus tem 2,60 m e a distância que o ônibus deve manter da bicicleta é de 1,50 m (Art. 201 do CTB).

A SMTT, em treinamento realizado, orientou os motoristas de ônibus a só ultrapassarem os ciclistas quando a faixa fica dupla, nos pontos de ônibus (uma incongruência, pois é justamente nos pontos que os ônibus param e as bicicletas seguem).

Desde novembro de 2013, quando o projeto da faixa azul foi apresentado no Conselho Municipal de Transportes, temos argumentado que, além de ser perigoso o compartilhamento da faixa azul entre ônibus e bicicletas, é injusto para as dezenas de passageiros dos ônibus terem que seguir pela avenida acompanhando uma bicicleta, que transporta apenas um passageiro.

Ainda aguardando que a motorista se acalmasse, continuei fotografando, até que ela abriu a porta do ônibus e um passageiro desceu esbravejando que eu tinha que sair da frente, pois estava atrasando a viagem de todos. Argumentei que eu estava zelando pela minha vida, para evitar uma tragédia. Ele me agrediu e, quando percebi que outros passageiros fariam o mesmo, montei na bicicleta e fui embora.

Cerca de duzentos metros à frente, no cruzamento com a rua Prof. Guedes de Miranda, vejo uma viatura da SMTT em cima do canteiro central, com dois agentes de trânsito que observavam a situação. Fui até lá e expliquei o acontecido, apontando para o ônibus enquanto ele passava. Os agentes disseram que não poderiam fazer nada baseados no meu depoimento, pois eles teriam que estar no momento do flagrante.

Perguntei se eu poderia repetir a situação ali, em frente a eles, com outro ônibus, já que grande parte dos motoristas estão agindo dessa forma. Eles disseram que não, pois não têm como medir a distância que o ônibus está da traseira da minha bicicleta, portanto, não têm como aplicar a multa que consta no Art. 192 do CTB.

Eles sugeriram que eu não ocupasse o meio da faixa e circulasse pelo bordo da via (Art. 58 do CTB). Perguntei se eu poderia trafegar dessa forma (pelo bordo da via), ali, na frente deles, para que eles multassem os motoristas que passam a um palmo do guidão da bicicleta, descumprindo o Art. 201 do CTB. Eles disseram que também não tinham como medir se o ônibus passou a menos de 1,50 m e, portanto, não teriam como multar.

Perguntei se tinha sido essa a orientação que eles tinham recebido da SMTT para tratar dos conflitos (esperados) entre ônibus e bicicletas na faixa azul. Eles disseram que não receberam qualquer treinamento, foram simplesmente designados para ficar ali, no canteiro central. Disseram que estavam vendo o ocorrido dali de onde estavam, mas não podiam se ausentar de seu posto para ir até lá e, por isso, já estavam ligando para a central, solicitando outra viatura.

A lição que a motorista do ônibus e o passageiro troglodita tiraram foi: Se uma bicicleta estiver “atrapalhando” sua passagem, ameace o ciclista com o ônibus. Se o ciclista não aceitar essa ameaça, abra a porta do ônibus para que um passageiro (ou seja, um anônimo) resolva a situação com violência.

E a lição que o ciclista pode tirar: A cidade não foi feita para você. As leis não estão a seu favor. Desista da bicicleta e faça o que as propagandas lhe dizem todos os dias: “ande de carro”.”


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Veja alguns exemplos do descumprimento ao Art. 201 do Código de Trânsito Brasileiro em Maceió: